sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Praga






















Em qualquer viagem gosto de saber o que estou a ver.

O guia Lonely Planet é por isso parte integrante da mochila. Nunca falha.

Fiquei surpreendido com a história do povo checo. Bem espremida a coisa, conclui-se que a liberdade e a independência são conceitos relativamente novos para um povo antiquissímo.

A história tem este encanto...os factos variam consoante o narrador.

Para os locais, a história da nacão conta-se através de um povo oprimido durante séculos e que sempre se tentou libertar do opressor.

Desde o séc.XVI que os checos estão sempre com alguém à perna. Contudo, não se pode falar propriamente de um "invasor". Faz-me lembrar o livro de história do 2 ano com fotografias das naus a chegarem ao Brasil e os indios em festa pela chegada dos Portugueses. As pilhagems, violacões e chacinas ficaram para mais tarde.

Mas dizia...

No séc. XVI, depois da morte de um rei cujo nome não me lembro o país atravessou um vazio de poder devido à ausência de sucessor. Tal como nos aconteceu e que nos brindou com 60 anos de sevilhanas. Os nobres locais, vendo esse vazio de poder, resolveram oferecer a lideranca da nacão à casa de Hapsburg. Não foram propriamente invadidos. Os nobres fizeram o possível para manter os seus previlégios, a maralha que se orientasse. Nada de novo.

Iniciou-se assim um domínio que só terminou no fim da primeira guerra mundial com a derrota do Império Austro-Húngaro. Pelo meio ainda tiveram algum tempo de ocupacão sueca. No fim da IGG a Checoslováquia proclamou a sua independência elegendo para presidente outro rapaz de nome giro que estava calmamente nos EUA à espera que a guerra acabasse (é o da foto a olhar para o palácio). Mas foi sol de pouca dura. Hitler, usando como desculpa uma minoria alemã que vivia no sul da Checoslováquia fez o que se sabe e encheu o país de tanques. Mais uns anos de domínio alemão até que o camarada Estaline apareceu. Então e depois? Depois foram mais 45 anos de domínio russo até alguém se ter lembrado de dar uma marretada no muro.

Pelo meio a primavera de Praga e outros mimos desses.

Não deve ser fácil ser checo. Até cansa.

Mas, para o turista que visita a cidade de Praga hoje em dia, toda esta história está presente na arquitectura. Cada parede reflecte um domínio. A parte velha de Praga é absolutamente fantástica. Confesso que não sabia se pertencia ou não ao património mundial da Unesco, mas, tendo em conta a sua beleza, não havia mesmo outra hipótese. Esta zona da cidade, relativamente grande, relata a passagem dos austríacos. Tudo é imperial, tudo é monumental. Nunca estive em Viena mas depois de ver o que fizeram em Praga, a curiosidade aumentou. Se nos afastarmos desta zona e nos dirigirmos para os arredores, comecam a aparecer os horríveis blocos da era Estalinista. Neste aspecto também não há que enganar. Seja em Varsóvia, Budapeste ou Praga (e imagino que seja assim em todas as capitais da "cortina de ferro"), o domínio russo está patente naquelas camaratas gigantes, cheia de tracos rectilínios, sem personalidade ou cor. O conceito era simples: alojar muitos e perto uns dos outros, para ser mais fácil controlar.

Gostei muito da gastronomia local. É, como se espera, essencialmente à base de carne. Bem apetitosa por sinal. Variada e em quantidades dignas de um repasto medieval.

Peixe não é muito com eles. Os checos só vêem mar na televisão e por isso o peixe que aparece nas ementas varia entre a carpa e o salmão (larga...). Quanto à cerveja....aí sim, acertam como ninguém. São os checos o povo que mais cerveja bebe no mundo e percebe-se porquê. A variedade é imensa e facilmente se descobre um verdadeiro néctar. E eu não sou propriamente apreciador de cerveja...

Fiquei também bastante supreendido com a quantidade de turistas que Praga atrai numa época que já se pode considerar baixa. Japoneses e espanhóis a perder de vista. E portugueses também. Muitos.

Praga é sem qualquer espécie de dúvida uma cidade que me encheu as medidas. O castelo, a ponte mandada construir por Charles IV, as estátuas de David Cerny, as casas por onde Kafka passou, a praca antiga com a sua torre do relógio e catedral, as cervejarias tradicionais e tantas outras coisas que fazem de Praga um destino a não perder.

Única nota negativa para a honestidade. É escassa. Desde taxistas (verdadeiros achados...), a recepcionistas de hotel e empregados de mesa. Não há quem não tente meter ao bolso. A simpatia também não é esbanjada, há que dizer.

Eu sei que ainda há menos de 20 anos andavam a ser apertados por todo o lado, mas convenhamos, este comportamento terceiro-mundista num membro da UE já é difícil de aceitar.

Ainda assim, basta ter um olho no burro e outro no cigano, negociar antes de entrar num táxi e pagar em coroas para não sofrer conversões habilidosas e nada vos desviará do objectivo principal, que é, descobrir Praga.

E bem que a cidade merece ser descoberta.


sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Eslovénia
























No título optei por colocar o nome do país em vez de uma cidade.

A razão é simples e prende-se com o tamanho do destino. A Eslovénia é um pequeno país nos Balcãs, talvez do tamanho do Alentejo. Ir de norte a sul é uma questão de poucas horas pelo que esta viagem, esta etapa, acabou por ser um pequeno tour pelo país.

O objectivo principal era experimentar, pela primeira vez para mim, umas férias activas, neste caso com caminhadas em montanha. Foi assim que surgiu o Triglav, a montanha mais alta da Eslovénia. O Triglav fica nos Alpes Julianos e tem perto de 3000m, a título de curiosidade, é a montanha que está representada na bandeira da Eslovénia e o seu nome significa "três cabecas", pois essa é a forma do pico da montanha. Subir o Triglav é, segundo os eslovenos, algo que cada habitante deve fazer pelo menos uma vez na vida. A base escolhida para o ínicio desta caminhada foi o lago Bohinj, uma verdadeira pérola da natureza. O percurso escolhido para atingir o topo chamava-se "7 jezero", os 7 lagos. Durante 4 dias caminhámos debaixo de um sol abrasador, subindo e descendo as montanhas que rodeavam o Triglav, vendo paisagens fabulosas e parando para dormir nos refúgios de montanha. A maior dificuldade, para mim, foi a ausência de água corrente durante a caminhada. Andávamos uma média de 10h por dia, com latas de atum às costas e suor a sair por todos os poros da pele. Ao fim de 4 dias estava num estado pouco bonito de se ver. Lembro-me de no último refúgio implorar e oferecer dinheiro para usar o wc dos empregados (que funcionava com água da chuva) ... não tive sorte e fui colar-me aos lencóis. Toda a caminhada decorreu, apesar da sua exigência, com normalidade. Os percursos estavam bem assinalados e a organizacão na montanha deixou-me impressionado. Fiquei contudo curioso quando vi, na véspera de atingir o topo, que todas as pessoas no refúgio tinham capacetes, parecidos com aqueles das obras. Não fazia sentido caminhar com aquele calor de capacete. Dormi intrigado.

No dia seguinte, logo pela fresquinha, desvendei o mistério. Parte do ataque ao cume era feito em escalada. Uma parede de 400m, com ferros cravados para ajudar a subir. O movimento de pessoas originava o deslize de pedras e o capacete evitava que se partisse a cabeca. Estava bem pensado sim senhor. Mas nós não tínhamos.

Seguimos assim, com cuidado e atencão redobrada de cada vez que passávamos por uma lápide indicativa de uma queda. Pé ante pé, cuidado nos ferros e olho nas pedras, subimos a parede e depois de mais umas horas a caminhar chegámos ao topo. O dia estava claro e pudémos apreciar a vista fabulosa que o Triglav oferecia. Senti pela primeira vez na minha vida que tinha colocado o meu corpo à prova e não deixei de sentir, uma vez no topo, alguma realizacão pessoal.

Regressámos ao lago Bohinj e depois de um demorado duche seguimos viagem.

A caminho da capital Ljubljana passámos por outro lago, o Bled, de águas claras e com uma curiosa ilha no meio, na minha opinião a pérola da Eslovénia.
Ljubljana é uma cidade pequena, muito pitoresca com o seu castelo altaneiro e, como é hábito por essa europa fora, construída à volta do seu rio. Fiquei impressionado com a organizacão, com as infra-estruturas, com a limpeza e com a modernidade da cidade. É bom lembrar que a Eslovénia é independente há menos de 20 anos. Na altura desta visita, o país ainda não pertencia à UE (embora estivesse em processo de adesão) e lembro-me perfeitamente de pensar que, uma vez na UE, rapidamente ultrapassaria Portugal. Confirmou-se.
Hoje, depois de ter visto outros países da antiga Jugoslávia concluo que a Eslovénia é de longe o mais avancado entre eles.
A minha única impressão negativa veio mesmo dos locais. Não esbanjavam simpatia...
Da capital seguimos para a costa, para a pequeníssima zona costeira da Eslovénia, mais especificamente para Piran, passando ainda pelas Skocjan Caves, património da Unesco.
A Eslovénia foi para mim, no seu todo, uma agradável supresa. Num pequeno espaco de terra possibilita ao viajante o contacto com o mar, com a montanha, com o património, com a cultura e com a história.
Foi uma das viagens que mais me marcou.







segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O ponto de partida: Lisboa
















Só poderia ser este o ponto de partida.
Lisboa é a cidade onde nasci, onde estudei e onde passei maior parte da minha vida. Mas Lisboa foi também o meu primeiro destino ou pelo menos a primeira cidade que me causou fascínio enquanto ponto de chegada. Entre 85 e 89 voava entre Santa Maria, nos Acores, e Lisboa, com alguma regularidade. A chegada a Lisboa acontecia sempre de noite e as imensidão das luzes impressionava quem acabava de sair de uma ilha com 17km de comprimento. Apesar de estar a viajar para a minha própria terra, sentia-me sempre um turista em trânsito.
Nessa altura, Lisboa era para mim o centro do mundo. A maior e mais barulhenta cidade que eu conhecia. A duas horas de lá chegar, já sorria ao ver o boeing da TAP aterrar em Ponta Delgada sabendo que aquele era o meu passaporte para as luzes.
Era um deslumbramento inocente.
Hoje vejo Lisboa com outros olhos. Já não a acho tão grande, a confusão faz parte do cenário, reparo mais nos prédios devolutos e de 85 para cá percebi para que serve essa maravilha da tecnologia chamada PDM. Descubro em cada esquina coisas feias que outrora me passavam ao lado. Objectivamente estão lá os prédios em ruínas, os muros cheios de rabiscos, os passeios sujos, as filas de trânsito, a selva de cimento desalinhada na cidade (ex: telheiras) e nos subúrbios, o Tejo coberto de tapumes. É essencialmente uma ligacão sentimental aquela que me liga no séc.XXI a Lisboa. Percebo hoje os seus defeitos e tento adaptar-me a eles. Tento aceitar uma realidade que eu gostava que fosse diferente.
Concentro-me então no que de bom a cidade tem para oferecer. E é tanto. Desde logo aquele magnífico céu azul que não existe em mais lado nenhum. É curioso que Lisboa, apesar de ter sido o ponto de partida há mais de duas décadas, continua a surpreender-me a cada regresso. Rara é a vez em que não descubro um novo ponto para contemplar o Tejo, um bairro castico, um restaurante memorável ou uma calcada rodeada de história.
É esta constante descoberta que motiva o meu encanto por Lisboa.
É o conforto de saber que as sete colinas foram o ponto de partida e serão, hoje ou amanhã, entre etapas ou no fim da volta, o meu ponto de chegada.