domingo, 10 de agosto de 2014

De Marraquexe a Hammamet




























É tempo de esquecer os planos de viagem. Decididamente não consigo cumprir um para amostra...
Há muitos anos que tinha alguma curiosidade por Marrocos. Não posso dizer que fosse um sonho, mas, dos nossos "vizinhos", era um dos que me cativava pela diferenca.
Segui a rotina do costume e informei-me qb sobre o destino. A zona do Sahara Ocidental (ocupada por Marrocos), Fez e Marraquexe chamaram-me à atencao. Com o tempo disponível e as ligacões existentes, a partir de Lisboa, optei por Marraquexe. Saída de Lisboa com passagem por Casablanca.
Antes de lá chegar já a coisa estava a correr mal. A Royal Air Maroc cancelou o meu vôo entre Casablanca e Marraquexe, colocando-me num horário que me obrigava a perder 7 horas em Casablanca ou no aeroporto. Em nenhum deles queria passar 7 minutos, quanto mais 7 horas. Esqueci o avião e entrei num comboio que, depois de 4 horas de deserto, me deixou em Marraquexe.
Primeira experiência positiva: o comboio. Pontual, confortável e seguro. Ponto negativo: a proximidade entre passageiros e a fome que eu tinha naquele momento. Não me senti bem a comer, sabendo que ao redor todos esperavam pelo pôr-do-sol para as primeiras dentadas. Estávamos em período de Ramadão.
Assim que a escuridão chegou, abriram as marmitas e partilharam comida. Provei então iguarias marroquinas que um dos passageiros me ofereceu. Gostei. Da comida e da simpatia.
Marraquexe é uma cidade de contrastes. Antigo ponto de passagem nas rotas comerciais que atravessavam o deserto, é hoje uma cidade com estilos opostos, dependendo do lado da Medina em que nos encontramos.
Cá fora temos largas avenidas, com palmeiras, lojas de luxo e hotéis de 5 estrelas. Uma espécie de Beverly Hills do deserto. Lá dentro, um labirinto de ruas em ruínas onde o caos parece ser a palavra de ordem.
Adorei, como é óbvio, esta parte antiga da cidade. A confusão, a cor, os cheiros (nem todos bons, diga-se), a vida. Inicialmente achei piada a todos os estímulos, às dezenas de pessoas que metiam conversa, ao desviar das motas, das bicicletas, dos cavalos. É como se uma onda nos envolvesse e nos deixássemos levar na frescura do mar. Percorrer aquelas ruas, procurar uma sombra, andar à sorte, observar os locais de culto onde não podemos entrar.
Dois dias depois tudo mudou. Já não aguentava não poder olhar livremente, sabendo que a pessoa com quem trocasse o olhar me tentaria vender algo. Perder a conta ao número de vezes que disse "não", sempre de forma educada mas firme, para evitar novas tentativas. Desviar-me do cavalo, depois da bicleta e depois da vespa, passou a ser cansativo. O cheiro de bosta de cavalo com 35 graus já não era exótico e as moscas no creme dos bolos, deixaram de ser diferentes.
Foi nesta altura que a Riad, uma casa típica convertida em hotel, mostrou a sua importância, transformando-se numa espécie de santuário no meio daquela confusão.
Fora da Riad passei a adorar as 19.30h de cada dia. Momento em que o sol se ia embora e os locais, cumprindo o fim do jejum, comecavam a comer. Eram os 20 minutos que tinha para passear sem me chatearem a cabeca.
Tinha que sair dali. Resolvi ir para Essaouira, cidade no Atlântico ocupada outrora por Portugueses, nas suas escapadas marítimas.
Tinha alguma expectativa com a praia e esperava, do fundo da alma, que me deixassem em paz, para apreciar a beleza natural e arquitectónica, que era de facto uma realidade.
Pelo caminho parei junto a uma árvore para fotografar as célebres "cabras voadoras". O pastor assim que me viu, fez um sprint de 200 metros para me vir cravar dinheiro. Depois de uma pequena discussão virei costas sem tirar qualquer fotografia. A que está ali em cima não é minha.
Em Essaouira vi uma medina muito bonita e um forte bem conservado. É claramente um ponto de passagem turistica. A praia, tida como uma das melhores de Marrocos, é apenas mediocre. Pelo menos para o standard português. Água barrenta e 500 melgas que, numa praia pública, tentam vender um lugar na areia de 10 em 10 metros. Acabei na areia, junto ao mar, deitado com uma mão na mochila e outra nos sapatos. Depois de me virem acordar para comprar droga, óculos e mais não sei o quê. achei que estava na hora de ir embora.
Voltei a Marraquexe, jantei na praca mais emblemática da cidade (Jamaa El Fna), na tasca de um marroquino que cantou o "Lisboa menina e moca" para me convencer a sentar. Diga-se que a gastronomia marroquina é fantástica. Fiquei fã. Nem as moscas tiram o sabor!
No dia seguinte, de madrugada e antes do sol nascer, saí do país rumo à Tunisia. Senti-me aliviado.
Incialmente tinha pensado que, entre banhos na costa tunisina, conseguiria dar um salto ao deserto do Sahara. Quando cheguei de Marrocos só queria estar deitado e sossegado. Mudei a rota e encostei os ossos em Hammamet, o Algarve lá do sítio.
Foi a primeira vez na minha vida que entrei num hotel com muros altos, grades, segurancas e coisas dessas. Não é bem o meu tipo de ambiente, já que não há qualquer contacto com as populacões locais em sitios destes mas, estava tão farto de "contacto", que estiquei a toalha na praia e pedi uma daquelas bebidas com sombreros de papel coloridos. Foi bom para as primeiras 24h. Depois aborrece.
Vim para a rua e comecei a percorrer a estrada que ligava o hotel ao centro da cidade. Poucos metros depois encontrei uma praia onde não havia um único turista. Familias de tunisinos enchiam a areia comemorando o fim do Ramadão (não me lembro do nome do feriado). Sentei-me e fiquei a observar. Tomei banho. Deixei a minha mochila na areia. Tirei fotografias. Ninguém me chateou, ninguém me tentou vender nada. Muito bem...estava num pais onde a populacão, tal como a marroquina, resultava de uma mistura de árabes com berberes, contudo, os hábitos eram outros. Agradou-me e segui para a medina.
Passei por um mercado e várias zonas de comércio. Não vi um único turista o que me levou a concluir que estariam todos nos resorts junto ao mar. Estava completamente misturado com os locais e nem por uma vez me tentaram impingir fosse o que fosse. Adorei.
Tal como a simpatia das pessoas, o mar mediterrâneo é naquelas paragens absolutamente divinal. Quente e cristalino. O repasto com muito peixe fresco na grelha também não era nada mau, mas, entre os dois países fiquei mais entusiasmado com o tacho marroquino.
A conclusão deste percurso é relativamente simples: duvido que algum dia volte a Marrocos, apesar do interesse que tenho no Deserto e na zona ocupada. Quanto à Tunisia, soube a pouco, a muito pouco. Voltaremos a ver-nos.